
Imagem de Ignessa Garmash
O mar... sempre o mar.
Não era azul, nem esmeralda, talvez turquesa. Talvez nem tivesse cor, talvez fosse só o azul do céu reflectido nas asas das gaivotas que lhe emprestasse aquelas tonalidades mágicas.
A areia e as pequenas pedras, de mãos dadas, rodeavam o oceano de espuma. A maré baixa deixara a descoberto pequenas grutas de caranguejos, peixes coloridos e buzios vazios.
Ao alto, alguns farrapos de algodão doce, a imitar nuvens, borrifavam o azul imenso.
E ela, esvoaçante... rodeada de gaivotas.
Uma brisa invisivel agitava-lhe os panos azuis com que se cobrira, imitando as cores do mar. Por breves instantes, pensou tratar-se de uma sereia perdida, esperando impaciente o encher da maré.
O pé dela espreitava as águas, as mãos segurando o vestido azul, a espuma a salpicar as rochas e o rosto de grãos de luz.
Impossível desviar o olhar.
Fechou os olhos.
Uma onda mansa invadiu-lhe os pensamentos, transportando-a para outros tempos e outros lugares. Recuou um pouco.
- É lindo, não é? – perguntou alguém ao seu lado.
Ela sorriu e acenou que sim, que era lindo.
Bem ao centro da imensa parede branca do museu, o quadro cativava todos os olhares.
Ela afastou-se um pouco mais.
“Mulher de azul com o mar ao longe”, podia ler-se na minúscula gravação da moldura de madeira escira.
Ela não precisava de o ler, sabia-o de olhos fechados.
Muitos anos anos, emprestara o corpo e o sorriso para o pintor, num verão longínquo no tempo, numa cabana de praia.
Amaram-se furiosamente, com a mesma intensidade daquele azul que ele conseguia pintar como ninguém.
A pintura partiu, o pintor também, a vida continuou no seu eterno ciclo de marés. Restou o quadro, uma mancha de azul hipnótico, numa imensa parede branca de museu.
Sorriu.
Apesar das rugas... o sorriso ainda era o mesmo.