
- Luís… tem que estar com mais atenção… assim vai perder o jogo…
O pequeno Luís ergueu a mão, como se fosse protestar. Mas de que adiantava ? A mãe era uma jogadora terrível, impiedosa mesmo. Utilizava sempre aquelas tácticas com nomes estranhos – a abertura francesa, a defesa russa – e fosse lá como fosse, conseguia sempre vencê-lo, com a maior das facilidades, em poucas jogadas…
- Mas a mãe ganha sempre – protestou ele – eu ainda nunca lhe consegui ganhar…
- Não conseguiu… porque não está concentrado. Nota-se perfeitamente que está com o espírito algures… muito longe daqui…
- Mas eu não gosto de xadrez…
- Claro que gosta – e a mãe dedicou-lhe um sorriso meigo – só talvez ainda não tenha descoberto que gosta…
- Não gosto, não… a sério que não gosto… prefiro ir visitar o mestre Bernardo, para ouvir as histórias que ele trouxe do Oriente…
A mãe continuou a arrumar as peças do jogo.
- O mestre Bernardo influencia-o demasiado, meu menino… e já devia saber que não deve acreditar em tudo o que ele diz… o mestre Bernardo tem alma de poeta, e já sabe como são os poetas…
- Mas, minha mãe… já imaginou como será … aquele mundo estranho, que o mestre Bernardo já viu? Ele contou-lhe aquela aventura em Goa, quando o capitão…
- Não, não e não – a mãe decidira colocar um ponto final no assunto. – O Luís já vai sendo crescido, dentro em breve irá começar as lições de armas e eu não quero que desperdice o seu tempo a ouvir as divagações do velho Bernardo…
- Mas, minha mãe…
- Luís !
- Sim, mãe…
- Luís Vaz de Camões, não insista comigo. A poesia nunca fez ninguém rico ou famoso. Dê ouvidos à sua mãe, que muito o estima.
Fez uma leve pausa.
- E agora… é a sua vez. Vá, vamos jogar mais uma partida. Precisamos de melhorar essa sua concentração…