
Olhou-se de novo ao espelho
O cabelo cortado curto, o rosto esguio, suave, aquela indefinivel doçura, impossivel de classificar.
Ajeitou os pequenos pingentes que lhe serviam de brincos. Nunca gostara de exibir demasiada cor, as cores escuras assentavam-lhe melhor, diziam.
A blusa justa colou-se ao peito, aderindo-lhe como uma segunda pele.
Simples.
Quando fora a última vez que experimentara aqueles sapatos?
Por vezes... – pensou – não cabia em si de felicidade, saboreando o prazer de poder percorrer as ruas, anónima, vulgar, longe dos flshes da fama, dos admiradores, de toda a confusão insana dos famosos, evitando os delirios da multidão.
O espelho devolveu-lhe o olhar. Um olhar suave, os lábios finos num permanente sorriso contagiante.
Sobre a superfície polida, vários papelinhos coloridos colados e num dos cantos, aquela fotografia.
Não se cansava de a admirar.
De todas as vezes que se observava ao espelho recordava as palavras da mãe, quando a vira vestida para o baile de finalistas, alguns anos antes.
- Filha... como estás linda... sabes que pareces mesmo a Audrey Hepburn? És igualzinha a ela...
A fotografia.
Sim... possuia algumas semelhanças, é certo. A forma do rosto, oval, a pele branca, talvez um pouco do olhar...
- Ah...mas a magia, aquela magia... o que tinha aquele rosto que ela não conseguia imitar?
Apagou a luz e preparou-se para sair.
Não.
Ela não era Audrey Hepburn.
Ela era simplesmente... ela própria.
E a magia? Sim... a magia... ela também a possuia, todos possuiam essa magia intocável que por vezes, permanece escondida toda uma vida, sem nunca brotar para o exterior.
Não.
Ela não era Audrey Hepburn.
Mas, naquele momento, sentiu-se especial.
E sabia que, quando saísse por aquela porta, seria especial.
Bastava acreditar.