
Fotografia gentilmente cedida pelo amigo João Meneres – obrigado João
Aquela janela verde. Como estaria ela agora?
Ainda existiria?
Rua das Flores, número dez, lembrava-se bem. A parede azul e branca, os batentes da porta com a forma de cabeças de leões, a chamimé de tijolo sempre a fumegar, as buganvilias vermelhas a espreitar pelo pátio.
Teria a rua ainda aquele velho empedrado, de pedras já gastas e luzidias? Ainda existiriam os mesmos candeeiros de ferro forjado, pendurados dos tectos? E o poço do bispo, ao fundo da rua... ainda alimentaria os canteiros de flores da dona Beatriz, o que seria feito dela?
Os olhos pousaram sobre os rostos da fotografia.
Um par de miúdos traquinas, só isso. Simplesmente, um par de miúdos... um aceno para a fotografia, ela a olhá-lo embevecida, ele despreocupado a posar para o fotógrafo casual.
Era inverno, ainda se cantavam as janeiras.
Ele chamava-se Bernardo, ela Alzira.
Ele brincava com carrinhos de madeira, heróis de papelão, bolas e fisgas de atirar aos pombos. Ela coleccionava bonecas e vestidos de folhos, andava sempre de vestidos de folhos.
Ele não reparara nela, ele não reparava em nada, para além do seu pequeno mundo de brinquedos, imenso quando se tem dez anos. Ela – Alzira – decidira sossegar aquele cantinho do coração que batia mais forte, sempre que ele se voltava para trás, nos bancos da escola. E perguntara-lhe simplesmente – Posso ir brincar contigo, depois da escola?
Pousou o album de fotografias e ajeitou os óculos. Ardia-lhe a vista, de cada vez que tentava destrinçar melhor os pequenos pormenores das fotografias – talvez por isso já a incomodava o tricot, coisa tão miudinha.
Um leve assobiar desviou-lhe o olhar.
- És muito teimoso, Bernardo, hás-de ser sempre teimoso... – e ajeitou-lhe melhor o cobertor sobre o peito. Mas o ressonar persistiu, aquele assobiar baixinho que ela já conhecia de há muito.
Quanto tempo se passara entretanto, desde aquela fotografia?
Sessenta anos? Talvez mais.
O fotógrafo ocasional, o tio do Bernardo, já falecera há muito, oferecera-lhe aquela fotografia num dia de aniversário, numa das suas visitas à aldeia.
Fora a primeira fotografia dos dois juntos, muito antes de todas as outras.
Sorriu, embevecida, a olhar para ele, como naquela mesma fotografia.
Como era lindo, mesmo a dormir, o seu Bernardo...
Olá Rolando
O carinho que transparece em toda a história é deveras enternecedor.
Penso que não haverá ninguém que não deseje para a sua vida uma história de amor e cumplicidade, como a que tão bem descreves aqui.
Adorei!
Bom feriado para ti.
Beijos
Manu
Ps: Já chove a Oeste
Olá, Manu...
Inspirei-me na fotografia do João, é verdade. Pensando sempre que aquele olhar pudesse eternizar-se no tempo..
Beijos.
Rolando
( Aqui a chuva aproxima-se a passos largos )
Que encanto! Que ternura! É bonito quando os sonhos se cumprem...beijinhos.
Oi, Paula...
Tão cedo, num feriado... já a navegar na Net?
Sonhos? É verdade... é bom quando os conseguimos cumprir... e temos que lutar por eles, persegui-los... persegui-los sem descanso...
Beijos.
Bom feriado de descanso para ti.
Rolando
De
Antonio a 5 de Outubro de 2009 às 13:39
Legal.
Beijos,
De
Eduardo a 5 de Outubro de 2009 às 19:06
Boa parceria! Ótimo post, !
Olá, Eduardo
Prazer em ver-te por cá. É verdade, o João gentilmente cedeu-me aquela foto, que tanto me chamara a atenção e pronto... olha, aí está o resultado.
Um abraço.
Rolando
De
luisa a 5 de Outubro de 2009 às 20:00
Estes são sim, laços de ternura que se prolongaram na visão para além do que viam pelos vidros da janela!
todos idealizamos algo parecido...um Bernardo docilmente a dormir, nos mais brancos lençois da casa, na mais fresca cama de muitos anos.
Belo!
Olá, Luisa...
O tempo, quando consegue envelhecer ao mesmo tempo que nós... creio que nos brinda com estas pequenas coisas, não é?
Obrigado por teres divagado por aqui...
Beijos
Rolando
Há Rolando... como é bela a vida quando os sonhos se cumprem....
Depois de 5 dias longe da internet, é bom chegar e ver que há quem olhe para a vida, veja a beleza das pequenas coisas e a traduza em textos como este.
Obrigado e boa semana
Jorge
Amigo Jorge...
Sejas bem aparecido... isso é que foi descanso, hem?
E como é... temos peripécias para contar? Muitas?
Um grande abraço
Rolando
Foi um fim de semana sabático...e muito molhado :-) e claro... peripécias há sempre :-)
A ternura atravessa o tempo e preenche espaços valiosos. Que história mais linda! Fico pensando se o mundo, hoje, tão cheio de tecnologia e de progresso, não está carente de emoções assim, tão plenas, tão puras! Grande abraço!
Maria Teresa...
Obrigado por te "perderes" por estes mares. Vou acreditando que o tempo, mesmo a passar, consegue criar assim pequenos momentos, que já lá estão, bem desenhados nos rostos das pessoas...
E aquele olhar da fotografia.... estava mesmo a chamar...
Abraços.
Rolando
Oi Rolando passei aqui , para deixar-lhe um beijo
e agradecer pelo carinho...
Que vc tenha uma linda semana querido.
De
libel a 6 de Outubro de 2009 às 14:03
Que mania que eles têem de se fazerem de distraídos, quando elas quase lhes saí o coração pela boca só com aquele simples olhar ...ahahaha..como tudo é natural e cheio de magia...Saudades!!..
Também tenho um Bernardo (filho) e como é reconfortante vê-lo a dormir...sentir a respiração e fazer-lhe festas no cabelo...
Beijinho Rolando
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