
( Participação na TERTÚLIA VIRTUAL de 15 de Julho - a última... )
Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, morro do Maranhão, Congonha, Minas Gerais... Brasil. Sábado pela manhã.
- E agora, como podem observar... estamos entrando no adro. À nossa volta, essas doze estátuas representam os doze profetas...
O guia, um moço ainda novo, olhar vivo e gestos incansáveis, ia acompanhando toda a explicação com pequenas observações, para delicia do grupo de turistas, todos portugueses, de visita ao Santuário.
- O santuário do Bom Jesus é património mundial desde 1985... e foi construido nos séculos XVIII e XIX por vários mestres, incluindo o famoso “ Aleijadinho”, que era o nome por que era conhecido o mestre António Francisco Lisboa...
Os turistas acompanharam-no ao longo da entrada para a capela, fotografando os frescos nas paredes, o estilo rocócó, as influências italianas.
- Magnífico, magnífico... repetiam, maravilhados...
- A primeira igreja foi construida em 1773... – continuou o guia, enquanto com um gesto autoritário ia chamando os turistas mais retardatários – e, como podem ver... a decoração da capela-mor é esplêndida...
Os turistas concordaram.
Mais flashes, muitas fotografias.
Um outro grupo de turistas, provavelmente japoneses, cruzou-se com eles, em sentido inverso. Os guias cumprimentaram-se efusivamente, e cada grupo lá continuou o seu caminho.
- E aqui temos... uma das partes mais interessantes do santuário... a zona das oito capelas...
As capelas, de planta quadrada, envolviam a capela-mor, cada uma delas com pinturas representando um dos passos da paixão de Cristo.
Todas... menos uma.
O grupo lá foi percorrendo a série de pequenas capelas, percorrendo os sete passos da paixão... até se deter defronte da oitava capela, de paredes vazias... sem qualquer fresco.
- E esta aqui? – quis saber um dos turistas, uma portuguesa já de certa idade, das poucas que aparentemente não fotografara ainda nada do santuário – porque está esta vazia? Removeram a pintura?
O guia deixou-se rir, bem disposto.
- Ah, essa... essa é outra história... essa tem uma lenda por detrás ...
Meia dúzia de cabeças voltaram-se para o guia, que propositadamente colocou a sua melhor entoação de mistério.
- Essa capela... foi a última a ser construida, sabe? ... por mestre Ataíde... e foi nessa capela que ele morreu...
- Houve algum acidente, quer dizer?
- Não... acidente nenhum. Mestre Ataíde foi incumbido de pintar as sete primeiras capelas, com as cenas da paixão do Cristo... e depois de as ter acabado, perguntou ao governador o que deveria pintar na última capela... e sabem o que o governador respondeu?
Abanaram a cabeça. Ninguém saberia, claro.
- Pois... o governador disse para ele: Mestre Ataíde... estou sem ideias. Portanto, decida você. O tema é livre, pode pintar o que quiser...
- E ele não pintou? – interrogou de novo a turista portuguesa.
- Pois... foi esse o problema... ele encerrou-se aqui dentro da capela... procurando inspiração, por não saber o que haveria de pintar...
- Mas não pintou nada, mesmo nada?
- Não... nada... e foi ficando, foi ficando... sempre à espera da inspiração que não veio... até que morreu... veja, é aquela laje ali, bem ao fundo, onde estão seus restos...
O grupo recuou uns passos, evitando pisar inadvertidamente a grande laje de mármore.
A turista portuguesa finalmente puxou da máquina fotográfica e apontando para a laje... disparou a sua primeira fotografia...