- Mãe... prometes não ficar zangada?
A mãe olhou para ele, quase encolhido à beira da porta. Não vinha dali boa coisa, pensou.
- Zangada? Bem... depende, não é? Deveria ficar zangada?
O filho acenou afirmativamente com a cabeça.
- ... Recebemos hoje os resultados daquela prova... lembras-te ? ... Aquela da composição...
- A composição? Claro que me lembro... foi das poucas ocasiões em que eu te vi a estudar...
- Pois... mas olha... a turma toda, não fui só eu... os resultados, sabes...
- Desembucha, filho, que me estás a deixar nervosa. Mas afinal o que aconteceu?
- Eu tive... zero.
A mãe abriu a boca de espanto. Seria possível conseguir “zero” numa composição em Português ? Pelo menos a caligrafia bonita do filho deveria merecer alguns pontos de bónus...
- Zero? – repetiu ela – Como assim, zero? Como é possível apanhar zero a redigir uma composição ? Tiveste assim tantos erros?
O filho abanou a cabeça, derrotado.
- Eu... eu... não conseguia pensar em nada...
- Mas filho... tu estudaste tanto... todos aqueles autores que a professora disse que eram importantes... eu vi-te sempre agarrado aos livros... o que é que correu mal?
- ... Foi o tema, mãe, foi o tema... não saiu nada daquilo que a gente estava à espera...
- O tema? Então qual foi o tema que saiu? Se foi alguma coisa que vocês ainda não falaram, eu vou lá à escola e faço...
- O tema, mãe... era Tema Livre.
- Tema Livre? Então vocês podiam escrever sobre o que quisessem?
O filho concordou, sem palavras.
- E tu... tu não escreveste nada?
- Não... nem uma palavra... só de pensar que não era nada que eu tivesse estudado... fiquei... petrificado.
E correndo para a mãe, agarrou-se-lhe à cintura, a cara escondida no avental, uma lágrima rebelde a assomar ao canto dos olhos...