Quinta-feira, 26 de Novembro de 2009

A Dama do Outono

 

 

 

Com extremo cuidado, inclinou-se e apanhou do chão mais uma folha.

Amarelo forte, quase alaranjado - e perfeita, de recortes simétricos, bem delineados, ainda brilhante e com um pé viçoso.

Na mão esquerda, já segurava outras três folhas, idênticas na forma e na perfeição dos traços, mas de tonalidades mais escuras, laranjas quase castanhos.

Afinal… eram essas as tonalidades do Outono.

 

Deslizou sobre o chão atapetado de folhas caídas, o longo manto a segui-la. Algumas aves mais afoitas pousavam no caminho, na esperança de alimento deixado a descoberto pelas folhas, levadas pelo vento. E a dama do Outono prosseguia imperturbável a sua demanda, na busca de mais algumas folhas.

 

O que procurava ela?

 

Algures num recanto que só ela conhecia, muitas outras folhas esperavam pacientemente por todas as que a dama recolhia agora. E da forma costumeira, ela levá-las-ia para junto das outras e voltaria a reordená-las tonas, numa fileira imensa de folhas, meticulosamente ordenadas do amarelo mais claro - quase branco - ao mais escuro dos castanhos, na panóplia das cores do Outono. Era essa a sua estranha, misteriosa missão, ao serviço dos senhores do tempo.

 

Em breve, teria todas as tonalidades possíveis. Um par de marcas vazias, aqui e ali espalhados pela fileira de folhas, anunciavam os locais exactos das folhas que ela ainda necessitaria de recolher, naquele mesmo dia, no dia seguinte, ou na semana seguinte.

Afinal de contas… o tempo não era ali a causa das coisas, simplesmente a consequência. Quando a sua fileira de folhas estivesse completa, levá-la-ia aos senhores do tempo e só então, nesse mesmo dia e não num outro qualquer, se daria por terminado o Outono e começaria o inverno.

 

E ela, a dama do Outono, poderia descansar novamente, durante longos meses, até a sua irmã do verão lhe passar o fardo das estações, no eterno ciclo das cores, da água, do vento, do frio e da neva.

Mas isso… seria depois.

Hoje, naquele dia presente… tinha esperanças de ainda encontrar pelo menos mais uma folha, para acrescentar à sua fileira do Outono.

 

 

 

 

 

 

publicado por entremares às 09:43
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7 comentários:
De libel a 26 de Novembro de 2009 às 16:58
Neste tempo de outono eu sou uma folha assim, soltando as amarras do que está velho em mim, e no embalo do vento neste impulso de mudança, a saudade no meu peito agora é esperança.

Beijinhos Rolando
De DyDa/Flordeliz a 26 de Novembro de 2009 às 16:58
Esta "dama" tem uma beleza que me encanta e cativa. Às vezes fria, outras vezes nublada e até mesmo chuvosa.
No entanto, mal as nuvens se afastam, ou o sol espreita logo as cores que foram lavadas pelo orvalho, ou pelas gotas da chuva, resplandecem brilhantes e cada dia mais maduras, fazendo sobressair radiosas as diversas tonalidades espalhadas pela natureza.
Se por um lado os dias mais pequeninos me deixam melancólica e até mais débil fisicamente, a verdade é que me atrai imenso, compensando os dias cinzentos com os que brilham em cor e contraste de luz.
Como ela, gosto de descobrir mais uma folha, mais uma cor, mais uma...para juntar à colecção que guardo no meu olhar.
De Paula Raposo a 26 de Novembro de 2009 às 19:04
Muita criatividade (como é teu apanágio).
Gostei.
Beijos.
De Sindarin a 26 de Novembro de 2009 às 22:20
Olá meu amigo. Que bonito, tanto a imagem como o texto. Obrigado pela sua vista. Deixo um beijinho com carinho.
De hasaliah a 26 de Novembro de 2009 às 23:00
ao som de vivaldi.... elas vêm umas depois das outras.

Agora as folhas podem até cair mais tarde, o verão vir mais cedo,,,, mas a ordem é a mesma,

em cada estação a natureza oferece-nos algo especial,,, como cada uma dessas folhas caídas..

amei
De Existe um Olhar a 27 de Novembro de 2009 às 11:02
Olá Rolando
As estações virão umas atrás das outras, preenchendo os nossos dias, ora com folhas secas, ora com flores...é o eterno ciclo da vida, uma roda que não pára e que nos dá a certeza que nenhum dia é igual ao outro...e tal como a dama de Outono, cada um de nós, tem esperança de encontrar sempre mais uma folha onde vamos lendo os belos textos que tu nos ofereces.
Muito obrigada Rolando!
Um óptimo fim de semana para ti
Beijos
Manu
De Regina d'Ávila a 27 de Novembro de 2009 às 16:49
Meu encantador,

Vou pegando as folhas...amarelas, marrons..meio desbotadas...apagadas..
Vou aguardar o outono se despedir...
Quem sabe no inverno..novamente..quem sabe...
E algo apareça junto com a primeira pérola de neve..
Quem sabe...

Milhões de beijos(oz),
Regina d'Ávila.
(fico aqui imaginando...em que momento ele escreveu este lindo conto?)

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