Era uma vez um girassol.
Um girassol quase vulgar, idêntico a tantos outros – castanho e amarelo, caule viçoso e erecto, bem equilibrado sobre o solo pedregoso, algures no meio do vale.
À sua volta, uma multidão de outras flores, inclluindo os da sua própria espécie, olhavam-no com um misto de estranheza e desdém, incompreensão até.
Aquele girassol em particular não acompanhava todos os seus iguais naquilo que precisamente os tornava únicos; poder girar, orientar-se para o sol, poder seguir a fonte de luz do nascente ao poente.
Não. Aquele girassol permanecia imóvel, sempre fitando um ponto desconhecido dos céus, alheio à luz do astro rei.
- Mas porque não giras tu com o sol? – questionavam-no sempre.
E ele, empertigado de vaidade, desdobrava-se sempre na mesma resposta.
- Ah, não vale a pena... vocês não percebem? O sol está tão fraquinho hoje... nem compensa o esforço de me mover.... quando chegarem aqueles dias de verão... então talvez me convençam...
E por melhores conselhos que lhe dessem, ninguém o demovia da sua estranha teimosia.
O inverno deu lugar à primavera e a primavera preparava-se para receber o verão, os dias corriam frescos e velozes, as papoilas intrometiam-se pelo amarelo dos malmequeres e lilás do alecrim. O campo de girassóis, colorido e viçoso, apresentava aqui e ali algumas clareiras, pejadas de outras flores e, a um canto... um girassol levemente diferente de todos os outros, de caule verde claro, pétalas delicadas e um tufo central castanho mel, de tonalidades muito mais claras que os demais girassóis.
E os vizinhos, da forma costumeira, lá insistiam.
- Então... é hoje que giras, girassol?
E o nosso girassol, sempre empertigado, lá lhes devolvia o mesmo olhar superior de sempre.
- Não... ainda não. Eu mereço um sol grande, um sol completo... não esta amostra insignificante. Esperarei mais alguns dias ainda...
Às portas do verão, aquele dia amanheceu sem a habitual brisa fresca das montanhas. O sol, livre de nuvens, brilhava com esplendor sobre o manto verde amarelo dos campos.
A temperatura subia... e subia... e subia...
Os girassóis, incomodados com tal calor, desviaram graciosamente o olhar para o chão.
Todos... todos excepto aquele girassol tão especial que, finalmente, decidira mover-se e girar, acompanhando o astro rei no dia mais quente do ano.
E aquele dia prolongou-se, prolongou-se... em luz e calor... por muito tempo.
Chegara o verão.
Na manhã seguinte, ninguém estranhou. Ninguém foi perguntar novamente ao girassol empertigado se ele finalmente se moveria.
A noticia correra célere pelo campo. A meio da tarde, o incauto girassol, sofrego de luz e calor, tombara queimado no chão, para não mais se erguer.
Um, dois, talvez três comentários em voz baixa sobre o assunto, não mais. Não valeria a pena. Ano após ano... a história repetia-se.
Os girassóis mais próximos trocaram entre si olhares de entendimento.
E o verão continuou, como se nada fosse com ele, abrasador e cheio de luz.